Caso Marielle: PF faz operação para cumprir mandados de busca e apreensão

Marielle Franco e Anderson Gomes — Foto: Reprodução/JN

A Polícia Federal realiza uma operação, na manhã desta quinta-feira (21), para cumprir oito mandados de busca e apreensão relacionados aos assassinatos da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes.





De acordo com a PF, o objetivo é apurar suposta tentativa de obstruir a investigação do crime. No próximo dia 14, os assassinatos de Marielle e Anderson completam um ano.

As medidas foram autorizadas pela Justiça Estadual após serem submetidas ao Ministério Público do Rio de Janeiro.

Um dos oito mandados é cumprido em endereço ligado a um PM citado em depoimento de Orlando Curicica. Orlando foi acusado por uma testemunha de envolvimento no atentado, ao lado do vereador Marcello Siciliano - ambos negaram à época.

Equipes também estão na cobertura onde mora um delegado federal.

'Labirinto'

A investigação sobre os autores do crime, os mandantes e a motivação está a cargo da Secretaria de Segurança do RJ. Coube à Polícia Federal a parte sobre obstrução nesse trabalho.





Semana passada, a Anistia Internacional denunciou problemas nas investigações e a falta de respostas dos agentes públicos no caso. "Onze meses depois, as investigações do caso Marielle Franco parecem que estão mergulhadas em um labirinto longe da solução", destacou Renata Neder, coordenadora de pesquisa da Anistia Internacional.

O que se sabe das investigações

As autoridades informam pouco sobre o crime, cuja apuração corre em sigilo. Do pouco que foi dito das investigações, destacam-se dois momentos:






  1. A delação que acusou o vereador Marcello Siciliano e o miliciano Orlando Curicica - ambos negam.
  2. A afirmação do secretário de Segurança, general Richard Nunes, de que Marielle foi morta por supostamente ameaçar grilagem de terras da milícia.

Antes, um resumo do dia do atentado e das investigações subsequentes.

O DIA 14 DE MARÇO


  • 19h: Marielle chega à Casa das Pretas, na Rua dos Inválidos, Lapa, para mediar debate com jovens negras.
  • Um Chevrolet Cobalt com placa de Nova Iguaçu, município da Baixada Fluminense, para próximo ao local.
  • Quando Marielle chega, um homem sai do carro e fala ao celular.
  • 21h: Marielle deixa a Casa das Pretas com uma assessora e Anderson. Pouco depois, um Cobalt também sai e segue o carro de Marielle.
  • No meio do trajeto, um segundo carro se junta ao Cobalt e persegue o veículo de Marielle.
  • 21h30: na Rua Joaquim Palhares, no Estácio, um dos veículos emparelha com o carro de Marielle e faz 13 disparos: 9 acertam a lataria e 4, o vidro.
  • Marielle e Anderson são baleados e morrem. A vereadora foi atingida por 4 tiros na cabeça. Anderson levou ao menos 3 tiros nas costas.
  • Assessora é atingida por estilhaços, levada a um hospital e liberada.
  • Criminosos fugiram sem levar nada.

O QUE FOI APURADO


  • Arma foi utilizada foi uma submetralhadora MP5 9 mm; tiros foram disparados a uma distância de 2 metros.
  • Munição pertencia a um lote vendido para a Polícia Federal de Brasília em 2006. A polícia recuperou 9 cápsulas no local do crime.
  • Ministro da Segurança, Jungmann diz que as balas foram roubadas na sede dos Correios na Paraíba, "anos atrás".
  • Ministério da Segurança afirma que a agência dos Correios na Paraíba foi arrombada e assaltada em julho de 2017 e que no local foram encontradas cápsulas do mesmo lote de munição.
  • Lote é o mesmo de parte das balas utilizadas na maior chacina do Estado de São Paulo, em 2015, e também nos assassinatos de 5 pessoas em guerras de facções de traficantes em São Gonçalo, na Região Metropolitana do Rio.
  • Polícia acredita que assassinos observaram Marielle antes do crime porque sabiam exatamente a posição dela dentro do carro. Vereadora estava sentada no banco traseiro – algo que não costumava fazer – e o veículo tem vidros escurecidos.
  • Testemunhas: assessora de Marielle e uma segunda pessoa foram ouvidas sobre o caso.
  • Polícia reuniu imagens de câmeras de segurança. Cinco das 11 câmeras de trânsito da Prefeitura do Rio que estavam no trajeto de Marielle estavam desligadas.
  • A investigação ganhou um reforço de 5 promotores, a pedido do responsável pelo caso.
  • Vereador e ex-PM miliciano são citados por testemunha.
  • Dois homens são presos suspeitos de envolvimento no caso.

A DELAÇÃO

Quase dois meses após o crime, em maio, uma publicação do jornal O Globo deu indícios do que pode ter sido a articulação para matar Marielle. A reportagem mostrou que uma testemunha deu à polícia informações que implicaram no crime o vereador Marcello Siciliano (PHS) e o ex-PM e miliciano Orlando Curicica.
Marcelo Siciliano presta novo depoimento na Cidade da Polícia — Foto: Carlos Brito/G1






A testemunha – que integrava uma milícia na Zona Oeste do Rio e foi aliado de Orlando – contou à polícia ter testemunhado uma conversa entre Siciliano e o miliciano na qual os dois arquitetaram a morte da vereadora. A motivação para o crime, segundo a testemunha, seria a disputa por áreas de interesse na região de domínio de Orlando.

"Ela peitava o miliciano e o vereador. Os dois [o miliciano e Marielle] chegaram a travar uma briga por meio de associações de moradores da Cidade de Deus e da Vila Sapê. Ela tinha bastante personalidade. Peitava mesmo", revelou a testemunha, de acordo com o jornal.

Tanto Siciliano quanto Orlando negam ter planejado a morte da vereadora. No mês seguinte à publicação de O Globo, o miliciano foi, a pedido da Segurança Pública do RJ, transferido para uma unidade prisional de segurança máxima.





Inclusive, os dois suspeitos presos em julho têm, segundo a polícia, estreita relação com a milícia de Curicica, chefiada por Orlando. Para investigadores da Delegacia de Homicídios, a dupla matou outros dois integrantes do grupo criminoso a mando do miliciano simplesmente porque havia a suspeita de um "golpe de estado" na quadrilha.

PONTOS DA DELAÇÃO


  • Testemunha diz que Marcello Siciliano (PHS) e Orlando de Curicica queriam Marielle morta.
  • Motivação seria avanço de ações comunitárias da vereadora na Zona Oeste.
  • Conversas sobre o crime teriam começado em junho de 2017.
  • Ex-aliado de Orlando citou, além de Siciliano e o miliciano, outras quatro pessoas.
  • Homem chamado "Thiago Macaco" teria levantado informações sobre Marielle.

A REAÇÃO DE ORLANDO

Orlando Curicica pediu para ser ouvido pelo Ministério Público Federal. Alegou que estava sendo pressionado pela polícia do Rio para assumir a autoria do assassinato de Marielle.





O Jornal Nacional teve acesso, com exclusividade, ao que Orlando disse a dois procuradores federais no dia 22 de agosto.
Ex-PM e miliciano Orlando de Curicica — Foto: Reprodução TV Globo

No depoimento, Orlando de Curicica contou que o responsável pela Divisão de Homicídios, Giniton Lages, esteve no presídio de Bangu em maio. O delegado queria ouvi-lo confessar que matou Marielle a mando do Siciliano. Ele se referia ao vereador Marcelo siciliano, do PHS, e à delação que acusou ambos.

Orlando acusa a testemunha de ser um miliciano que se desentendeu com ele. Orlando disse ter respondido ao delegado Giniton Lages que não tinha envolvimento com o caso e que o delegado teria pedido então para ele acusar o vereador Marcelo Siciliano:

“Fala que o cara te procurou, pediu para você matar ela, você não quis, e o cara arrumou outra pessoa. Mas que o cara que pediu para matar ela”.

Orlando recusou e disse que foi ameaçado. Falaram que iam transferi-lo para um presídio federal e colocariam mais três ou quatro homicídios na conta dele.





Orlando acusa a testemunha de ser um miliciano que se desentendeu com ele. Orlando disse ter respondido ao delegado Giniton Lages que não tinha envolvimento com o caso e que o delegado teria pedido então para ele acusar o vereador Marcelo Siciliano:

“Fala que o cara te procurou, pediu para você matar ela, você não quis, e o cara arrumou outra pessoa. Mas que o cara que pediu para matar ela”.

Orlando recusou e disse que foi ameaçado. Falaram que iam transferi-lo para um presídio federal e colocariam mais três ou quatro homicídios na conta dele.

GRILAGEM COMO MOTIVAÇÃO

Em entrevista ao "Estado de S.Paulo" em dezembro, o secretário de Segurança, general Richard Nunes, afirmou que a vereadora Marielle Franco foi morta por milicianos que viam nela uma ameaça a negócios de grilagem de terras na Zona Oeste do Rio.

A fala de Nunes veio um dia após operação malsucedida para prender suspeitos de envolvimento no crime.
Secretário Richard Nunes dá entrevista para a GloboNews — Foto: Reprodução/GloboNews

A ENTREVISTA

Nunes falou ao "Estadão" no dia 14 de dezembro.

"Era um crime que já estava sendo planejado desde o final de 2017, antes da intervenção", disse Nunes ao "Estadão".
"Ela estava lidando em determinada área do Rio controlada por milicianos, onde interesses econômicos de toda ordem são colocados em jogo", prosseguiu. "O que leva ao assassinato da vereadora e do motorista é essa percepção de que ela colocaria em risco naquelas áreas os interesses desses grupos criminosos", emendou.





"A milícia atua muito em cima da posse de terra e assim faz a exploração de todos os recursos. E há no Rio, na área oeste, na baixada de Jacarepaguá, problemas graves de loteamento, de ocupação de terras. Essas áreas são complicadas", continuou Nunes.

Ainda segundo o secretário, Marielle vinha conscientizando moradores sobre a posse da terra. "Isso causou instabilidade e é por aí que nós estamos caminhando. Mais do que isso eu não posso dizer", afirmou.

OPERAÇÃO OS INTOCÁVEIS

Em 22 de janeiro, cinco pessoas foram presas em uma operação contra milícia que age em grilagem de terras no Rio. Entre eles, estava um major da PM e um tenente reformado.





Agentes da Polícia Civil que trabalham no caso Marielle Franco consideraram a prisão do major Ronald Paulo Alves Pereira estratégica para a investigação. Eles suspeitam da participação dele na morte da vereadora, mas não especificaram qual seria o nível de envolvimento.
Ronald Paulo Alves Pereira, major da PM, chega preso à Cidade da Polícia — Foto: Reprodução/GloboNews

De acordo com o Ministério Público, o major Ronald era um dos principais envolvidos no mercado imobiliário ilegal na região de Rio das Pedras.





O major Ronald foi homenageado em 2004 pelo deputado estadual e senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), que propôs uma moção de louvor a ele na Assembleia Legislativa do RJ (Alerj). O ex-capitão Adriano da Nóbrega, que está foragido, recebera a mesma homenagem do filho do presidente um ano antes.


Fonte: G1

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